Entrevista | Denise Cunha. 1ª Conferência Municipal de Saúde Mental de Itabirito
- tribunapopularita
- 8 de abr. de 2022
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1ª Conferência Municipal de Saúde Mental de Itabirito: “um momento ímpar de construção coletiva”
Denise Cunha, Assistente Social e representante da Casa Lar, falou à Tribuna Popular sobre a sua percepção e participação na 1ª Conferência Municipal de Saúde Mental de Itabirito
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A 1ª Conferência Municipal de Saúde Mental de Itabirito aconteceu nos dias 1º de abril, das 14h às 17h, e 02 de abril, das 8h às 14h, no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Minas Gerais, campus Itabirito. O tema central da Conferência foi: “A Política de Saúde Mental como Direito: Pela defesa do cuidado em liberdade, rumo a avanços e garantia dos serviços da atenção psicossocial no SUS”.
A Conferência esteve organizada a partir de 4 eixos:
Eixo 1: Cuidado em liberdade como garantia de direito e cidadania;
Eixo 2: Gestão, financiamento, formação e participação social na garantia de serviços de saúde mental;
Eixo 3: Política de saúde mental e os princípios do SUS: universalidade, integralidade e equidade;
Eixo 4: Impactos na saúde mental da população e os desafios para o cuidado psicossocial durante e pós-pandemia.
Participante da Conferência, Denise Cunha concedeu uma entrevista à Tribuna Popular.

1ª Conferência Municipal de Saúde Mental de Itabirito. Foto Tribuna Popular.
Denise, fale um pouco para os leitores da Tribuna Popular sobre a sua trajetória pessoal e profissional.
Sou Denise Cunha, uma baiana moradora em Itabirito há mais de 20 anos, uma cidade que me acolheu profissionalmente e como cidadã do lugar. Sou Assistente Social, já fui servidora pública no município nas áreas de saúde e assistência social por muitos anos, e hoje trabalho no Conselho Regional de Serviço Social/CRESS-MG, que é o órgão que representa a categoria de Assistentes Sociais no estado. Na Conferência representei o segmento de usuários, já que faço parte da Diretoria da Associação Casa Lar de Itabirito, instituição responsável pela Gestão da Unidade de Acolhimento Institucional de crianças de 0 a 12 anos, chamada “Casa das Crianças”, mais conhecida como “Casa Lar”.
Como você avalia a situação da saúde mental em Itabirito?
O serviço de saúde mental em Itabirito é muito bem estruturado, com equipes bem preparadas tecnicamente, e a oferta em separado a partir das especificidades do público adulto e infanto-juvenil são os pontos fortes. Mas, sem dúvidas, há ainda pontos de reflexões críticas no sentido de pensar avanços: como promoção de uma atuação mais “extramuros” e relacionais com a comunidade; uma busca ativa mais efetiva de usuários; maior número de recursos humanos que possa atender a demanda de forma mais continuada e menos espaçada; existência de um serviço de convivência como parte da oferta do serviço de saúde mental; dentre outros pontos que foram, inclusive, apontados na Conferência.
Qual a importância de abordar a interseccionalidade em saúde coletiva, principalmente na saúde mental?
Na verdade é impossível pensar políticas públicas sem levar em conta a mediação e a interlocução entre classe, raça e gênero. Ainda que, ao pensar políticas públicas, há que se pensar na totalidade da população. Se pensarmos o conceito de saúde, como resultante das condições gerais de vida, e não como somente ausência de doenças, o serviço público de saúde, na perspectiva de saúde coletiva, precisa estar estruturado para atender as demandas de quem mais efetivamente se utiliza destes serviços. E eles/as são trabalhadores/as de baixa renda, no geral negros/as e mulheres. E são demandas específicas, especialmente para o segmento de mulheres no campo da saúde mental.
Como você avalia a 1ª Conferência Municipal de Saúde Mental de Itabirito?
Foi excelente: tanto em organização, infraestrutura, participação e recepção, até as propostas deliberadas que foram bastante discutidas e, na minha opinião, muito exequíveis. Foi de fato um momento histórico, considerando ter sido a 1ª Conferência de Saúde Mental no Município. O espaço das conferências é uma importante conquista democrática de construção de políticas públicas de forma coletiva, com participação da comunidade e trabalhadores/as da área e a gestão. É um excelente espaço de diálogo. Particularmente, o ponto de reflexão foi a pouca participação de usuários da saúde mental. Fica aí o desafio para que essa presença seja efetivamente incentivada e garantida.
Como abordar a saúde mental nos espaços de luta coletiva?
O processo de adoecimento mental pode chegar para qualquer pessoa, especialmente nestes tempo de tantas perdas, de toda ordem, causada por essa conjuntura de desmontes de direitos e de dignidade humana. O que significa dizer que a temática da saúde mental cabe em qualquer lugar, inclusive nas lutas coletivas, nas discussões partidárias, por segmentos de luta. A luta antimanicomial precisa ser uma luta e compromisso de todos nós. Que seja a defesa por uma política de saúde mental que atenda aos sujeitos nas suas singularidades, incorporados aos seus núcleos familiares e às suas comunidades. Esse é o foco da luta!
Em Itabirito percebe-se uma segmentação na prestação de serviços públicos. Especificamente no âmbito da saúde mental, como a Saúde pode trabalhar com a Assistência Social?
Então, por mais que as políticas sociais tenham normas próprias que as regem, é fundamental pensar a transversalidade destas políticas públicas. Então a Saúde precisa conversar com todas as demais políticas públicas, como Educação, Assistência Social, Política Urbana, e todas as outras, na perspectiva da universalidade do acesso e respostas às demandas de forma integral.
E na conjuntura nacional, você vê alguma esperança na construção de espaços salutares, principalmente às mulheres?
Vixe! São tempos difíceis, efetivamente! Temos um Governo Federal que não pensa em diversidade, inclusão, acesso e ampliação de direitos sociais. Ao contrário, foram muitos os retrocessos, em especial como apontado por você na pergunta, relativo à política para mulheres. Os retrocessos foram muitos e em vários âmbitos. Só a luta e a mudança da perspectiva de gestão voltada aos interesses dos/as trabalhadores/as poderão, de novo, nos fazer esperançar, como diz Paulo Freire.
Como as políticas de saúde pública do âmbito federal refletem nos âmbitos estaduais e municipais, principalmente no aspecto da saúde mental?
A perspectiva privatista do SUS e negacionista do Governo Federal fere de morte os direitos da população. Veja o resultado desastroso da gestão da pandemia. O SUS salva e salvou vidas! E especificamente com relação à saúde mental, a dinâmica imposta pelo Ministério da Saúde é de implementação de uma política de retrocessos, de volta aos tratamentos na modalidade de manicômios, em contraponto à política de saúde mental com o tratamento em liberdade. É claro que isso impacta nas ações tanto do estado quanto dos municípios, considerando o lugar do Governo Federal não só relativamente ao repasse de recursos como na implementação de normas para os serviços. Felizmente resta a luta, e a luta do movimento antimanicomial é intensa e potente neste país, estado e município de Itabirito, que também se coloca presente, por meio dos/as seus/uas trabalhadores/as nesta luta.
Qual é a importância histórica desta conferência em Itabirito?
Histórico, potente, fundamental, participativo! Um momento ímpar de construção coletiva dessa política pública. O que esperamos agora é que as propostas aprovadas na plenária final sejam implementadas pela gestão da Secretaria de Saúde. E finalmente gostaria de agradecer a Tribuna Popular pela oportunidade e parabenizá-los pela grandeza dessa construção de espaço de comunicação democrática com a comunidade de Itabirito.
Redação Tribuna Popular.
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